sexta-feira, 3 de junho de 2011

APP e reserva legal

PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA 282 DO STF.
FUNÇÃO SOCIAL E FUNÇÃO ECOLÓGICA DA PROPRIEDADE E DA POSSE. ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RESERVA LEGAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELO DANO AMBIENTAL. OBRIGAÇÃO PROPTER REM. DIREITO ADQUIRIDO DE POLUIR.
1. A falta de prequestionamento da matéria submetida a exame do STJ, por meio de Recurso Especial, impede seu conhecimento. Incidência, por analogia, da Súmula 282/STF.
2. Inexiste direito adquirido a poluir ou degradar o meio ambiente.
O tempo é incapaz de curar ilegalidades ambientais de natureza permanente, pois parte dos sujeitos tutelados – as gerações futuras – carece de voz e de representantes que falem ou se omitam em seu nome.
3. Décadas de uso ilícito da propriedade rural não dão salvo-conduto ao proprietário ou posseiro para a continuidade de atos proibidos ou tornam legais práticas vedadas pelo legislador, sobretudo no âmbito de direitos indisponíveis, que a todos aproveita, inclusive às gerações futuras, como é o caso da proteção do meio ambiente.
4. As APPs e a Reserva Legal justificam-se onde há vegetação nativa remanescente, mas com maior razão onde, em conseqüência de desmatamento ilegal, a flora local já não existe, embora devesse existir.
5. Os deveres associados às APPs e à Reserva Legal têm natureza de obrigação propter rem, isto é, aderem ao título de domínio ou posse.
Precedentes do STJ.
6. Descabe falar em culpa ou nexo causal, como fatores determinantes do dever de recuperar a vegetação nativa e averbar a Reserva Legal por parte do proprietário ou possuidor, antigo ou novo, mesmo se o imóvel já estava desmatado quando de sua aquisição. Sendo a hipótese de obrigação propter rem, desarrazoado perquirir quem causou o dano ambiental in casu, se o atual proprietário ou os anteriores, ou a culpabilidade de quem o fez ou deixou de fazer. Precedentes do STJ.
7. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.
(REsp 948921/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2007, DJe 11/11/2009)



AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. MATA CILIAR. CORTE. ART.
2º DO CÓDIGO FLORESTAL. MATA ATLÂNTICA. DECRETO 750/93. SUPRESSÃO DE VEGETAÇÃO EM VIOLAÇÃO AOS TERMOS DA LICENÇA AMBIENTAL EXPEDIDA.
1. Exceto nos casos de comprovada utilidade pública ou interesse social, a Lei 4.771/65 (Código Florestal) literalmente proíbe a supressão e o impedimento de regeneração da Mata Ciliar, qualquer que seja a largura do curso d'água.
2. A proteção legal como Área de Preservação Permanente ciliar estende-se não só às margens dos "rios", mas também às que se encontram ao longo de "qualquer curso d'água" (Código Florestal, art. 2º, "a", grifei), aí incluídos riachos, córregos, veios d'água, brejos e várzeas, lagos, represas, enfim, todo o complexo mosaico hidrológico que compõe a bacia.
3. O regime jurídico das Áreas de Preservação Permanente ciliares é universal, no duplo sentido de ser aplicável à totalidade dos cursos d'água existentes no território nacional – independentemente da sua vazão ou características hidrológicas – e de incidência tanto nas margens ainda cobertas de vegetação (Mata Ciliar, Mata Ripária, Mata de Galeria ou Mata de Várzea), como naquelas já desmatadas e que, por isso mesmo, precisam de restauração.
4. Ao juiz descabe afastar a exigência legal de respeito à manutenção de Mata Ciliar, sob o argumento de que se está diante de simples “veio d'água”, raciocínio que, levado às últimas conseqüências, acabaria por inviabilizar também a tutela das nascentes (“olhos d'água”). Mais do que nos grandes rios, é exatamente nesses pequenos cursos d'água que as Matas Ciliares cumprem o papel fundamental de estabilização térmica, tão importante à vida aquática, decorrente da interceptação e absorção da radiação solar.
5. A Constituição Federal ampara os processos ecológicos essenciais, entre eles as Áreas de Preservação Permanente ciliares. Sua essencialidade decorre das funções ecológicas que desempenham, sobretudo na conservação do solo e das águas. Entre elas cabe citar a) proteção da disponibilidade e qualidade da água, tanto ao facilitar sua infiltração e armazenamento no lençol freático, como ao salvaguardar a integridade físico-química dos corpos d'água da foz à nascente, como tampão e filtro, sobretudo por dificultar a erosão e o assoreamento e por barrar poluentes e detritos, e b) a manutenção de habitat para a fauna e formação de corredores biológicos, cada vez mais preciosos em face da fragmentação do território decorrente da ocupação humana.
6. Seria um despropósito tutelar apenas as correntes mais caudalosas e as nascentes, deixando, no meio das duas, sem proteção alguma exatamente o curso d'água de menor volume ou vazão. No Brasil a garantia legal é conferida à bacia hidrográfica e à totalidade do sistema ripário, sendo irrelevante a vazão do curso d'água. O rio não existe sem suas nascentes e multifacetários afluentes, mesmo os menores e mais tênues, cuja estreiteza não reduz sua essencialidade na manutenção da integridade do todo.
7. O Município, contrariando a legislação vigente e os termos da licença expedida, desmatou a Mata Ciliar.
8. A ilegalidade do desmatamento provocado pela Prefeitura de Joinville é patente. A licença expedida pelo Ibama previa, textualmente, que a supressão de vegetação poderia ser feita, desde que “respeitados rigorosamente o disposto na letra 'a' do artigo 2o do Código Florestal, Lei 4.711/65, com as alterações introduzidas pela Lei n. 7.803/89, ficando o responsável pela execução dos trabalhos de exploração com a obrigação de preservar a faixa marginal do curso d'água existente na propriedade”.
9. O descumprimento das exigências da legislação ambiental para a hipótese de supressão da Mata Atlântica é causa de nulidade das autorizações eventualmente concedidas e dos atos praticados (art. 10 do Decreto 750/1993), sendo devida a recomposição ambiental da área afetada.
10. Recurso Especial provido.
(REsp 176753/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/02/2008, DJe 11/11/2009)
 

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